Recentemente a Amnistia Internacional (AI) lançou um relatório em que a polícia portuguesa é acusada de “uso excessivo de força”, tanto sobre minorias étnicas quanto sobre manifestantes. Do mesmo relatório, constam ainda reparos gerais sobre o avacalhamento dos direitos humanos, fruto das medidas de austeridade implementadas nos últimos anos, pintando-se assim o quadro negro que ninguém – seja manifestante, minoria ou simples carne para canhão da austeridade – necessita que o façam por ele.
Pondo de parte os reaccionários mais trauliteiros, para os quais as denúncias da AI serão sempre mariquices de esquerdistas lacrimejantes, temos os que desempenham voluntariamente (ou de forma profissional) o papel de esquerdista lacrimejante, tratando de recuperar estes documentos para a sua retórica estratégica de vitimização permanente do “povo sem poder”: o que perpetua a ideia que a força é património exclusivo do Estado ou das elites governantes, e que dissemina a sensação de impotência que nos transforma em gado a caminho do matadouro, ou da salvação por interpostas vanguardas.)
Temos então que perante o Terror Social instalado e instituído, paira esta tenaz ideológica que o justifica, por aceitação ou falsa oposição, e que nos mantém reféns da presente ordem social, convencendo-nos ora que as coisas afinal não estão assim tão más, ora que estamos mesmo na merda e que não podemos fazer nada em relação a isso (a não ser esperar que a AI, ou qualquer outra organização defensora dos direitos humanos se condoa com o nosso sofrimento, caucionando por arrasto os que querem reajustar à esquerda o capitalismo, restaurando assim a ordem constitucional, democrática e humanista.)
Ora, se queremos escapar a este buraco sem fim por onde escoam todas as nossas energias e boa parte da nossa alegria de viver, teremos necessariamente de deixar de ser vítimas do “uso excessivo de força” - por parte do braço armado do Estado e do Capital, bem como do bolor ideológico onde fermenta, em plena “guerra civil”, a “paz social” -, e passar a ser culpados do “uso necessário de força” a fim de nos libertarmos.
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